Disponibilização: quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano XIII - Edição 2979
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metros, a João Batista Pereira, destacada da área maior composta pelas duas matrículas referidas (fls. 142 e seguintes). Em
2006 também, locaram a área livre remanescente das duas matrículas a Eduardo Aparecido Pereira, para fins comerciais, para
instalar no local lava rápido de veículos (fls. 146 e seguintes). O locatário Eduardo é filho do locatário João Batista. Eduardo
vivia em união estável com a autora da presente ação. A autora alega que ocupou com o companheiro parte do imóvel locado a
ele, adjacente à casa do sogro dela, onde construíram em etapas, ao longo dos anos, casa na qual passaram a morar. A
construção teria se iniciado há mais de 10 anos. Depois houve dissolução da união estável e a autora permaneceu nessa casa
com os filhos da união desfeita. Ela argumenta que, desde a construção, passando a usar essa parte do imóvel como moradia,
teria agido com ânimo de dona, preenchendo os requisitos para a usucapião especial urbana, pois a posse teria sido mansa e
pacífica, com ânimo de dona, de casa com 121 metros quadrados, conforme apuração pericial, não sendo ela proprietária de
nenhum outro imóvel. Ocorre que, pelo teor das provas produzidas, especialmente a pericial, não há demonstração suficiente da
alegada posse apta à usucapião. Com efeito, o perito ilustrou a situação no local com a imagem de satélite de fls. 347, marcando
em amarelo a área da Matrícula 69.177 e em verde a da Matrícula 69.178, ambas do 2º Registro de Imóveis local. Delimitou em
vermelho a casa que a autora pretende usucapir. Vê-se que são duas matrículas contíguas. O imóvel da Matrícula 69.177 tem
saída pela Rua João Faria Filho. O da Matrícula 69.178, pela Rua Charqueada. A casa onde mora a autora fica integralmente na
área da Matrícula 69.178, com saída pela Rua Charqueada. Como se vê no croqui de fls. 356, a casa onde mora a autora
constitui um prolongamento da casa locada ao sogro dela. O perito marcou com cinza a casa locada ao sogro, onde ele ainda
reside, e em vermelho a casa de moradia da autora e seus filhos. No croqui de fls. 357, o perito apresenta planta da casa onde
mora a autora, demonstrando ter área total de 121 metros quadrados. No croqui de fls. 358, apresenta planta da casa locada ao
sogro, com sua área perimetral e divisões internas. O perito ilustrou o laudo, em seguida, com diversas fotos dos imóveis,
incluindo vestígios da rampa do lava rápido do ex-companheiro da autora (fls. 381). A partir de informações obtidas no local,
prestadas pela autora, o perito elaborou o croqui de fls. 383, demonstrando a idade aparente das várias etapas da construção
da casa onde ela mora. Como se vê nesse croqui, houve uma parte inicial, prolongamento da casa do sogro, que incluiu dois
dormitórios e um banheiro, edificada há cerca de 12 anos. Depois, há nove anos aproximadamente, foi construído um novo
dormitório. Há cerca de seis anos, foi construída a sala e a cozinha. Finalmente, há dois anos mais ou menos, a garagem. O
perito recordou que a autora havia alegado, na petição inicial, que a área da casa onde reside seria de 144 metros quadrados.
Mas tal área, nessa extensão, atingiria parte da casa onde mora o sogro dela, como afirma o perito a fls. 386, apresentando
demonstração dessa afirmação no croqui de fls. 387. Na sequência do laudo, o perito examinou os contratos de locação de
2006, observando aspecto que é muito relevante para a solução da causa. Constou expressamente da locação efetuada ao
sogro da autora que a casa a ele locada tinha oito metros de frente, por 35 metros nas laterais. Efetuando a medição no local,
com base nessas metragens, o perito apurou que a área locada ao sogro se sobrepõe à maior parte da área da casa onde
reside a autora. A ilustração dessa afirmação consta do croqui de fls. 392, pelo qual se vê, destacado em amarelo, a área de
8x35 metros locada ao sogro, atingindo quase a área toda da casa onde mora a autora. O perito ainda efetuou pesquisa por
meio do Google Earth Pro, recuperando imagem de satélite de 2005, reproduzida a fls. 393, anterior aos contratos de locação de
2006, verificando que a construção então existente tinha aproximadamente 29 metros de comprimento. Fazendo a sobreposição
dessa construção de 29 metros de comprimento com a situação atualmente encontrada, o perito demonstra, no croqui de fls.
394, que a primeira fase da edificação, alegada pela autora, acima referida, que incluiria dois dormitórios e o banheiro, já existia
em 2005, antes do início da locação ao sogro. A partir dessa constatação, o perito concluiu a fls. 395 que a autora e o companheiro
inicialmente moravam no imóvel locado ao sogro e, depois, foram promovendo ampliações na casa, nas etapas seguintes,
acima discriminadas, com inclusão de novo dormitório, depois a sala e cozinha e por fim a garagem. Quanto à prova testemunhal,
foram ouvidas três testemunhas arroladas pela autora. Devalci afirmou que a autora residia nessa casa com o companheiro,
mas depois se separaram e ela lá permaneceu com os filhos, não sabendo se compraram ou alugaram o imóvel, acreditando
que a autora e o companheiro construíram a casa. Fabiana, vizinha, disse ter se mudado para as proximidades há 11 anos,
mesma época na qual a autora teria passado a morar nessa casa, composta por dois cômodos e que depois foi sendo
paulatinamente ampliada. Rodinei Paulino afirmou que se mudou para a Rua Charqueada há nove anos e a autora e o
companheiro moravam na casa em questão, que foi sendo por eles ampliada. Pelos contestantes, foram ouvidas duas
testemunhas, topógrafo e sua assistente, que estiveram no imóvel, contratados pelos contestantes, apurando que autora estava
ocupando uma casa existente no local. Sendo esses os elementos de prova mais relevantes, vê-se que a parte da casa, que
teria sido construída há cerca de 12 anos pelo relato da autora ao perito, incluindo dois dormitórios e o banheiro, na verdade já
integrava a casa que havia sido locada pelos contestantes ao sogro da autora. Em consequência, está correta a conclusão do
perito, de que, inicialmente, a autora e o companheiro passaram a morar na casa do sogro, ocupando parte dela. A ocupação
deles foi autorizada pelo sogro, no exercício por parte deste da posse direta como locatário, sem excluir a posse indireta dos
locadores. Não era, portanto, posse exclusiva da autora e do companheiro, ou do sogro dela, com ânimo de dono, mas posse
direta derivada de locação, com ciência da obrigação de devolução do imóvel aos locadores ao término do contrato.
Posteriormente, como visto, há cerca de nove anos pelo relato da autora ao perito, houve ampliação da casa, com construção
de mais um dormitório. Mas essa construção ocorreu como prolongamento da casa locada ao sogro, ou seja, como acessão
realizada em área possuída não com ânimo de donos, mas com base na posse direta objeto da locação. Como salientado
acima, pelo teor do croqui de fls. 392, essa ampliação, de mais um dormitório, situava-se na área de 35 metros das laterais, do
imóvel locado ao sogro, ou seja, não é possível, por conta dessa ampliação, considerar que desde então teria passado a existir
posse apta à usucapião. Pelo contrário, era posse decorrente da locação, posse direta, que não exclui a posse indireta dos
locadores. Ocorreram depois, há cerca de seis e dois anos respectivamente, novas ampliações, a primeira, correspondente à
sala e à cozinha, que atingiu parte da área composta pelos 35 metros de comprimento do imóvel locado ao sogro e parte área
que originalmente correspondia ao terreno vazio, locado ao ex-companheiro da autora. Mas essa invasão da área externa à
locação do sogro, não pode ser dissociada da posse derivada da locação a ele. A invasão da área além dos 35 metros só
ocorreu por força das acessões até então construídas na área locada ao sogro. Não fosse a posse direta decorrente da locação
ao sogro, a autora não teria promovido essa ampliação. A ocupação da autora, portanto, decorreu de mera liberalidade do
sogro, locatário, possuidor direto, sem excluir a posse indireta dos locadores. Trata-se de posse direta, sem excluir a indireta, e
não posse com ânimo de dono. Não é de posse apta à usucapião. Em nenhum momento houve ato inequívoco da autora,
perante os contestantes, pelo qual ela possa lhes ter revelado inversão do ânimo da posse, de posse direta derivada da locação
para posse com ânimo de dona. Somente se tivesse havido ato inequívoco dessa inversão do ânimo da posse seria possível
iniciar a contagem da prescrição aquisitiva para fins de usucapião. Como visto, inicialmente ela e o companheiro ocuparam
parte do imóvel que havia sido locado ao sogro dela. Depois foram promovendo ampliações na casa, o que não basta para
configuração de posse apta à usucapião. Pelo contrário, tal atitude correspondeu a inadimplemento contratual, da locação, pela
promoção de acessões e benfeitorias sem autorização dos locadores. Em reforço, observe-se que, durante todos esses anos,
foram os contestantes quem pagaram os impostos sobre os imóveis das duas matrículas em questão, a demonstrar que não os
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