Primeiramente, cumpre observar que o objeto da ação originária é a cobrança de multa administrativa aplicada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Trata-se, portanto, de execução fiscal de natureza
não tributária, à qual não se aplica o entendimento retratado no REsp n. 1.645.333/SP, julgado sob o regime dos recursos repetitivos, cuja decisão determinou a suspensão dos processos em curso. Este representativo refere-se,
tão somente, a créditos tributários.
Conforme a decisão recorrida, a execução foi redirecionada aos sócios-administradores, ora agravantes, em razão da existência de certidão do Oficial de Justiça atestando que a sociedade empresária não se
encontra mais instalada em seu endereço de cadastro fiscal, aplicando-se, então, o teor da Súmula 435 do STJ:
Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal
para o sócio-gerente.
Sobre essa questão, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n. 1.371.128/RS, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, firmou a tese no sentido de que: “em execução fiscal de dívida
ativa tributária ou não-tributária, dissolvida irregularmente a empresa, está legitimado o redirecionamento ao sócio-gerente”.
Por oportuno, transcrevo a ementa do paradigmático precedente:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. REDIRECIONAMENTO DE EXECUÇÃO
FISCAL DE DÍVIDA ATIVA NÃO-TRIBUTÁRIA EM VIRTUDE DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DE PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE. ART. 10, DO DECRETO N.
3.078/19 E ART. 158, DA LEI N. 6.404/78 - LSA C/C ART. 4º, V, DA LEI N. 6.830/80 - LEF.
1. A mera afirmação da Defensoria Pública da União - DPU de atuar em vários processos que tratam do mesmo tema versado no recurso representativo da controvérsia a ser julgado não é
suficiente para caracterizar-lhe a condição de amicus curiae. Precedente: REsp.
1.333.977/MT, Segunda Seção, Rel. Min. Isabel Gallotti, julgado em 26.02.2014.
2. Consoante a Súmula n. 435/STJ: "Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o
redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente".
3. É obrigação dos gestores das empresas manter atualizados os respectivos cadastros, incluindo os atos relativos à mudança de endereço dos estabelecimentos e, especialmente, referentes à
dissolução da sociedade. A regularidade desses registros é exigida para que se demonstre que a sociedade dissolveu-se de forma regular, em obediência aos ritos e formalidades previstas nos
arts. 1.033 à 1.038 e arts. 1.102 a 1.112, todos do Código Civil de 2002 - onde é prevista a liquidação da sociedade com o pagamento dos credores em sua ordem de preferência - ou na forma da
Lei n. 11.101/2005, no caso de falência. A desobediência a tais ritos caracteriza infração à lei.
4. Não há como compreender que o mesmo fato jurídico "dissolução irregular" seja considerado ilícito suficiente ao redirecionamento da execução fiscal de débito tributário e não o seja para a
execução fiscal de débito não-tributário. "Ubi eadem ratio ibi eadem legis dispositio". O suporte dado pelo art. 135, III, do CTN, no âmbito tributário é dado pelo art. 10, do Decreto n.
3.078/19 e art. 158, da Lei n. 6.404/78 - LSA no âmbito não-tributário, não havendo, em nenhum dos casos, a exigência de dolo.
5. Precedentes: REsp. n. 697108 / MG, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 28.04.2009; REsp. n. 657935 / RS , Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,
julgado em 12.09.2006; AgRg no AREsp 8.509/SC, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 4.10.2011; REsp 1272021 / RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques,
julgado em 07.02.2012; REsp 1259066/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 28/06/2012; REsp.n. º 1.348.449 - RS, Quarta Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
11.04.2013; AgRg no AG nº 668.190 - SP, Terceira Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13.09.2011; REsp. n.º 586.222 - SP, Quarta Turma, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 23.11.2010; REsp 140564 / SP, Quarta Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, julgado em 21.10.2004.
6. Caso em que, conforme o certificado pelo oficial de justiça, a pessoa jurídica executada está desativada desde 2004, não restando bens a serem penhorados. Ou seja, além do encerramento
irregular das atividades da pessoa jurídica, não houve a reserva de bens suficientes para o pagamento dos credores.
7. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.
(REsp 1371128/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/09/2014, DJe 17/09/2014)
Com efeito, a dissolução irregular da sociedade empresária, a qual se presume com a constatação de que a empresa deixou de funcionar no seu domicílio fiscal (Súmula 435 do STJ), configura ilícito suficiente
para o redirecionamento da execução fiscal de dívidas tributárias. A responsabilidade do sócio-administrador, na hipótese, exsurge, então, da aplicação do artigo 135, III, do CTN.
Na linha do aludido precedente da Corte Superior, constatada a existência da mesma situação fática descrita na Súmula 435 do STJ, também se deve entender por configurado o ilícito de dissolução irregular da
empresa no tocante à cobrança da dívida ativa não tributária, a viabilizar o redirecionamento da execução fiscal.
Embora o fundamento legal do redirecionamento da execução fiscal seja diferente nas situações acima delineadas, em ambas exige-se a prática de ilícito suficiente a ensejar a responsabilidade dos sóciosadministradores da executada, seja com fundamento no artigo 135, III, do CTN, seja pela aplicação do Código Civil.
Não se verifica, portanto, a existência de elemento de discrímen razoável para que se aplique soluções distintas na ocorrência da mesma situação fática: a constatação, em sede de execução fiscal, de ter a empresa
deixado de funcionar no seu domicílio fiscal, a caracterizar a dissolução irregular.
A propósito, em recentes julgados, o STJ mantém a aplicação da tese firmada no REsp n. 1.371.128/RS. Confira-se:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. REDIRECIONAMENTO DE EXECUÇÃO FISCAL DE DÍVIDA NÃO
TRIBUTÁRIA EM VIRTUDE DE INDÍCIO DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DE PESSOA JURÍDICA. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N. 1.371.128/RS.
NOVA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS DELINEADOS NO ACÓRDÃO RECORRIDO. NÃO INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ.
1. "Não ofende o princípio da Súmula 7 emprestar-se, no julgamento do especial, significado diverso aos fatos estabelecidos pelo acórdão recorrido. Inviável é ter como ocorridos fatos cuja
existência o acórdão negou ou negar fatos que se tiveram como verificados." (AgRg nos EREsp 134.108/DF, Rel. Ministro Eduardo Ribeiro, Corte Especial, DJ 16/8/1999, p. 36).
2. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do REsp n. 1.371.128/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, DJe 17.9.2014, firmou entendimento
no sentido da possibilidade de redirecionamento da execução fiscal contra o diretor da empresa executada, por dívida de natureza não tributária, uma vez que compete aos gestores das
empresas manterem atualizados os respectivos cadastros, incluindo-se os atos relativos à mudança de endereço do estabelecimento e à dissolução da sociedade, haja vista que o indício de
dissolução irregular é apto a ensejar o redirecionamento da execução para o sócio-gerente, conforme a legislação civil, não havendo a exigência de dolo, uma vez que não "há como
compreender que o mesmo fato jurídico 'dissolução irregular' seja considerado ilícito suficiente ao redirecionamento da execução fiscal de débito tributário e não o seja para a execução fiscal
de débito não-tributário. 'Ubi eadem ratio ibi eadem legis dispositio'".
3. O fato de a empresa executada encontra-se em lugar incerto e não sabido gera a presunção da dissolução irregular, hábil a promover o redirecionamento do executivo fiscal ao sócio gerente.
4. Agravo regimental provido, divergindo do eminente Relator.
(AgRg no REsp 1218579/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/05/2016, DJe 21/06/2016)
No mesmo sentido, são os seguintes precedentes desta Terceira Turma:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. INCLUSÃO DE SÓCIO NO POLO PASSIVO. DÍVIDA NÃO TRIBUTÁRIA. DISSOLUÇÃO IRREGULAR.
POSSIBILIDADE.
1 - Na folha 22, observa-se que a pessoa jurídica não foi localizada em seu domicílio fiscal por Oficial de Justiça em 15/7/2010.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 07/04/2020 1020/2478